Minhas viagens 276

     Havia um cãozinho ainda filhote, era do Sandro, um dia ele o chamou para acompanhá-los ao trabalho, voltando mais tarde muito consternado dizendo que havia matado o cão. Não entendi, mas logo depois procurei me informar junto ao Giba do ocorrido, então ele me disse entre gargalhadas, matou sim, o cachorro atravessou a pista e como o Sandro assustou e gritou, o cão voltou rapidamente, nisso um carro o atropelou, o culpado foi ele sim.

Minhas viagens 275

     Na parte oposta da onde eu montara a barraca, os patos tinham uma grande liberdade, e entre as varandas da lateral e a do fundo estavam tão horríveis, que demorei de um a dois dias para criar coragem para limpar as sujeiras dos bichos naquele local. No mesmo dia em que limpei o Sandro juntou resto da comida e fazendo um som característico de chamar os animais os reuniu ali como de costume, alimentando-os, eu lhe falei: pô Sandro, me deu mó trabalho limpar isso ai, não dava pra jogar em outro local não? -Sempre joguei comida aqui e vou continuar jogando, respondeu ele muito irritado, complementei: tudo bem, faça como queiras.

Minhas viagens 274

     O Sandro dormia em um dos dois quartos da sede da fazenda, levantava cedo e saia com o facão pendurado na cintura e a foice na mão, às vezes acompanhado pelo Sete-léguas que passou uns dias fora resolvendo problemas, principalmente de saúde e em um dos dias que veio a fazenda, foi sobre uma moto velha, dizia que havia comprado por uma baixa quantia e que ela estava muito boa. O Giba ficava sempre nas proximidades e quando dava, vinha até mim e conversávamos, às vezes me ajudava, mas a melhor das coisas que ele fez foi assumir a ordenha do leite, isto após eu dizer que não devíamos ficar sem o produto e também falei que poderíamos fazer queijo. A princípio ele disse que eu faria, mas logo ele próprio assumiu, sendo assim, todos os dias tínhamos de meio a um quilo do produto, que comíamos especialmente com café, lógico.

Minhas viagens 273

     Como aprendi com a esposa do Sete-léguas, passei a lavar quase diariamente a grande varanda que rodeava a casa, também a área de trás, onde fazíamos as refeições, por fim fui lavando o piso grosso, que ficava no fundo ao redor do refeitório, principalmente lá, os patos e galinhas, cães e gatos faziam o que queriam e podiam, também em outras áreas, quando eu estava por perto tocava-os das áreas internas, mas não era fácil.

Minhas viagens 271

     Parece-me que o Giba me disse que ele (Sandro), havia falado que não deveriam confiar em um estranho, ainda mais tratando-se de comida. No segundo ou terceiro dia falei ao Sandro que não mais cozinharia e comeríamos da comida dele, ele respondeu que não, que continuaria fazendo o suficiente para ele e que nós se virássemos com a nossa, era complicado, pois não havia muitas panelas e tampas e eu ficava responsabilizado por aquilo tudo, meu consolo era que duraria pouquíssimos dias.

Minhas viagens 270

    Jamais imaginei que atitudes como a do Sandro pudessem repetir, mas está ocorrendo agora, não entre estranhos que se juntam para trabalhar, não estou criticando ou julgando, apenas narrando fatos de minhas viagens, e na realidade por mais que alguns achem um absurdo, já foi dito que em maldade somos todos iguais. O que temos que fazer é eliminá-la e a única forma é começar de novo, tentar e nunca desistir, e não deixar para o amanhã.

Minhas viagens 269

     Tomávamos café o dia todo, quando acabava às vezes até já noite e eu me negava a fazer, alguém o fazia, sei que não faz bem a quem pretende ter um bom sono noturno, tomar café quatro ou cinco horas antes de deitar seria o ideal, tendo eu exercido está prática de não ingeri-lo pelo menos três horas antes do meu repouso, e aquela viagem em especial era minha intenção não usá-lo durante os 42 dias e também passava por minha mente abolir seu uso para sempre.

Minhas viagens 268

    Na segunda ou terça como haviam me informado que era de costume o doutor ir embora, como última recomendação pediu-me que ficasse encarregado da comida dos peões. Óbvio que aceitei, e disse-lhe para não se preocupar. Na primeira refeição o Sandro (calunga), recusou a comer, tendo preparado seu próprio almoço, não entendi aquele comportamento, mas o Giba me alertou que ele não comeria da comida que eu fizesse. Havia outras coisas evolvidas, mas não me lembro bem, parece que estava relacionado a tal discursão do curral.

Minhas viagens 267

     Já naquele domingo, quando comentamos sobre o que comeríamos no almoço, me dispus à fazê-lo, não me lembro que carne foi, fiz como faço em casa: arroz, feijão, carne, salada. O doutor comeu e não mais dispensou as outras que vim a fazer, tendo inclusive sugerido certo dia que eu fizesse um peixe, apesar de não ter experiência em fazê-los a não ser fritos, disse-lhe que iria tentar, porém logo ao começar a limpá-lo, me cortei, então passei para o Giba o termino do prato do dia.

Minhas viagens 266

     Ah! o Giba me pediu várias vezes para lhe explicar o que era uma barraca e sempre demonstrava não entender, até que a viu montada e me disse: - é isso que é uma barraca? Eu imaginava outra coisa. Me considero um homem corajoso, não tenho medo de nada estando com minha faca, agora o caboco sair com isso aí, para o meio do mato, em um lugar que não conhecia... isso não é coragem não, isso é ser louco. Eu sou corajoso, você é um louco. 

    Reafirmei a ele que apesar da faca e o facão estarem sempre ao meu lado, desejei por muitas noites estar dentro de uma estrutura impenetrável, por qualquer que fosse o animal.

Minhas viagens 265

      Após 3 ou 4 dias sem escrever e sem estudar, aqui estou, porque? Muito incomodado com o frio, ouço o noticiário "mínima de três, podendo nevar em alguns lugares nas próximas horas", não quero acreditar, não suporto mais esse frio. Sou do centro de um país tropical, mas tudo bem... Conto os dias, conto as horas para este inverno passar, já me informaram que isto acontecerá em fins de setembro, mês no qual deve ocorrer a mudança do frio ao calor, aguardo.

Minhas viagens 264

     Apesar da insistência do doutor não dormi na casa, armei minha barraca na área do lado, que dava para o córrego e também para o curral, e também uma casinha distante, cerca de 70 metros, que dias depois fiquei sabendo que o Giba lá dormia. Me recusei a tomar banho quente, tendo ido ao córrego, mas apenas uma ou duas vezes, não resisto aos encantos de um chuveiro quente, mesmo sabendo que não nos faz bem, a água fria é bem mais saudável, ainda mais aquela que descia das montanhas da Chapada dos Veadeiros

Minhas viagens 263

    Nos últimos angustiantes dias do acampamento, numa tarde deitei sobre um plástico grande que havia levado e sempre me foi muito útil. Fiquei por um período observando o céu, e algumas nuvens iam em uma direção e logo acima outras em outra contrária, pelos meus incertos cálculos, menos de 300 metros as separavam, achei muito estranho, também havia alguns urubus próximos a elas, e percebi que um estava atacando outro, e um deles tinha uma mancha branca, não identifiquei se no pescoço ou na asa.